Foto falida #2 – Castanheira à luz da lua

 

Dentre as cerca de 16 mil espécies de árvores da floresta Amazônica, a castanheira (Bertholletia excelsa) é uma das mais icônicas e longevas, podendo passar dos 500 anos de idade. Seu grande porte, chegando a 50 metros de altura, e sua copa característica, permitem reconhecê-la de longe, tanto nas áreas abertas por pastagens, como dentro da própria floresta com dossel relativamente fechado. Após o declínio do ciclo da borracha na Amazônia, a extração de sua semente, conhecida como castanha-do-pará, castanha-do-brasil ou castanha-da-amazônia, foi essencial para o sustento econômico de muitas famílias, em especial nos estados do Amazonas e Pará. Ainda hoje, a extração da castanha é importante para muitas famílias amazônicas, sendo o estado do Acre um dos maiores produtores no Brasil. 


A ampla distribuição pan-amazônica sugere que há centenas de anos a castanheira tenha sido manejada pelos povos originários, assim como outras plantas frutíferas importantes da floresta. Mas a abertura de pastagens para a criação de gado, incentivada em meados do século XX, culminou no desmatamento contínuo até hoje e essa é a principal razão de a castanheira estar na lista de espécies de plantas ameaçadas de extinção. Desde 1994, porém, o corte da castanheira, assim como da seringueira, é proibido por lei.


Por serem protegidas por lei, as castanheiras sobressaem nas paisagens degradadas e desmatadas, dominadas por áreas abertas utilizadas para pastagens de gado bovino, como na foto abaixo. E foi nessa paisagem que perdi uma foto que gostaria muito de ter feito, durante um trabalho de campo no estado do Acre – onde ainda estou.

 

 

Estávamos em duas equipes dentro da floresta. Uma delas retirando as amostras de solo para entender o efeito das queimadas para o estoque de carbono, e a outra abrindo uma trilha para encontrar, com sistema GPS de alta precisão, pontos exatos para medição da estrutura florestal coletados por satélite. Logo no início da tarde, quando ameaçou uma forte chuva, a equipe de solo bateu em retirada. Nós, no segundo grupo, finalizamos o trabalho debaixo de um típico dilúvio amazônico. Essa chuva transformou os ramais (estradas de terra) em puro barro. Nosso carro atolou várias vezes, até que conseguimos auxílio de um trator local para nos rebocar por alguns bons quilômetros de estrada. Para auxiliar nas manobras de desatolagem, fiquei fora do carro e fiz o trajeto no barro a pé – em alguns momentos, até mais rápido do que o carro e o trator. 


Levamos mais de 4 horas para andar cerca de oito quilômetros no barro. Nisso anoiteceu e a lua cheia raiou no horizonte. Quando o trator já rebocava o carro mais à frente e eu não precisava mais auxiliar nas manobras, passei a pé por uma área um pouco mais aberta e vi a lua ainda baixa no céu e em meio às nuvens. Andando no escuro, a silhueta de uma castanheira se formou em frente à luz da lua. Suspirei. Olhei para o carro rebocado pelo trator que já estava longe… E minha câmera lá dentro, salva do barro e da chuva. Tão perto, mas, naquele instante, tão longe. Guardei a cena na mente e pensei: essa será minha próxima “foto falida”. 


Esse fato aconteceu há dois dias e ao descrevê-lo ainda tão fresco, não sei se consegui representar a cena. Terei outras expedições ao mesmo local nos próximos meses e tentarei fazer com que essa foto falida se torne uma foto “foto do mês”.

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